quarta-feira, abril 01, 2009

A NOVENA - primeira parte

Já fazia mais de três meses que tinha mudado prá lá, e ainda não tinha colocado os pés na igreja matriz .
- Não sou muito religiosa - Já fui mais, até catecismo eu já ministrei.
Mas naquela tarde eu estava a caminho da escola quando passei pela praça central..as ruas estavam calmas, era a hora da cesta, os cachorros... - Ai meus benditos cachorros que sempre chamam a minha atenção... continuavam preguiçosos nos alpendres, e os filhotes deitavam-se vadios pelo gramados das casas, as borboletas disputavam espaços com os beija-flores. Era quase uma paisagem, apenas quebrada a estática quando esses seres apareciam aos olhos de quem vagava por aquelas ruas e comungava a união de sons e movimentos quase despercebidos.
O sol ardia na lataria dos carros e as janelas abertas movimentam as cortinas das casas...grandes cadeiras e bancos enfeitavam as varandas e os velhos acomodavam-se confortavelmente acolhidos pela brisa que os cobria em respiros leves e refrescantes.
Nesse meio de tarde enxerguei a grande e amarela igreja matriz - Parei meu carro próximo a casa Paroquial que ficava do outro lado da rua. Sua grande e antiga porta, pintada de azul claro,mantinha-se cerrada e carregava um recado pregado avisando dos horários de atendimentos e todos os compromissos da semana que seguia.
Não havia um corpo se quer naquele lugar... até o momento que entrei na igreja e dei de cara com a senhorinha que varria aquele imenso e santo salão repleto de memórias e pedidos...assustei-me com ela, mas seu sorriso e um cumprimento gentil desfez o meu espanto momentâneo.
Olhei ao redor e bancos enfileirados dispunham-se em cima de um piso gasto, eram gigantescas lajotas que se intercalavam entre o preto e o branco, formando um imenso tabuleiro de xadrez .
- Além de nós duas....ninguém mais podia ser visto a olhos nús. Olhei para todos os lados. Queria naquele momento falar com Deus...enxerguei duas fileiras menores em cada lateral do templo e duas bem maiores concentravam-se no centro do salão mantendo um largo corredor para que os fieis pudessem caminhar.
Escolhi a fileira grande do lado esquerdo do salão..e sentei-me no terceiro banco contados a partir do altar...Era um sensação de paz que fazia perceber o silêncio que minha alma clamava...Eram mais que imagens, apelos e lamentos ouvidos...era o agradecimento do silêncio sentido - Não lembro ao certo se me ajoelhei, mas no momento ocorrido sentava com a mesma distância para dentro do banco que meu corpo ocupava.
O silêncio foi quebrado por um murmurinho ouvido no fundo do salão e logo foi mantido apenas ao som de passos que se aproximavam em minha direção..e junto daqueles passos um toque intercalava cada pisada...era o som da bengala que soava dividindo o peso do corpo que carregava. Minha reza, minha paz, meu sossego escaparam do meu peito e fugiram para uma canto qualquer e escoraram-se naquelas imagens de santos que enfeitavam a igreja na espera da saída da intromissão.
No momento seguinte um grunhido me chamou a atenção, olhei para o lado, e em pé, bem perto do começo do banco quase ao meu lado parada estava uma senhora baixa de calças largas, grandes quadris, cabelos na altura da nuca dando a impressão de terem sido recentemente pintados e grandes óculos escuros. Olhava para mim como se eu estivesse fazendo alguma coisa errada estando ali - O problema é que eu estava. E , ela sem pestanejar pediu que eu fosse um pouco mais para o meio do assento - Nesse momento eu não acreditava que aquilo estava ouvindo, olhei ao redor e ali via centenas de bancos vazios, pensei. - Não. ela só pode estar brincando . E olhei de volta fazendo-a perceber o que pensava. Ela por sua vez entendeu perfeitamente meus pensamentos que quase gritavam aos seus ouvidos e foi logo explicando seu pedido. Enquanto eu, com um sorriso de uma tentativa de entender sua atitude, dava-lhe o espaço pedido, e arrastava meu traseiro pro meio do banco ocupado.
E ela foi logo falando. Mas eu, não sabia ao certo se prestava atenção em suas palavras ou se a ajudava a sentar, pois devido ao seu tamanho as madeiras a atrapalhava no movimento, e ainda tinha a bengala que segundo ela, era ela que a ajudava pois, de nada lhe valia aquele pedaço de pau - Ingrata. Pensei. - Coitada dessa, que em sintonia com teus passos te equilibra e sustenta teu corpo pesado e lento...E ela falava...sabe minha filha, hoje é terça - feira, a segunda terça-feira do mesmo e há 17 anos, mesmo quando o Padre Marcos não estava aqui, pois não sei se você sabe, mais ele está aqui há somente cinco anos...Então, mas nesse dia ás 15:00h, tem novena, que horas são? - 14: 27 . Eu respondi. E continuava ouvindo aquela conversa..não sentia irritação nenhuma naquele momento, o absurdo acontecia e ela calmamente dizia - então minha filha, eu sento aqui nesse mesmo lugar há 17 anos,
por isso te incomodei...

20 comentários:

aapayés disse...

una entrega que nos haces excelente, con mi té al lado, disfruto tu texto..que buenísimo compartir con vos tu post...

saludos fraternos

un abrazo con mucho cariño

besos

:.tossan® disse...

Que narrativa rica! Agora se eu quiser te ver em outro lugar é só procurar no Sr do Vale, lá sempre encontro um poema seu. Beijo

Selena Sartorelo disse...

Olá Adolfo,

Esse texto é um ensaio de pequenos contos que quero contar...acho que com chá e biscoitos deve ficar melhor rsrsr. beijos.

Oi meu querido amigo Tossan,

Adquiri esse costume de escrever comentando e estou sempre explicando minha intromissão. E sempre tento me desculpar dizendo isso pro Sr. do Vale que esses poemas que escrevo..seja lá no particulas(lugar que adoro estar) ou em qualquer outro blog (pois só comento quando sinto) ou cada casa que frequento que os poemas não são meus, mas sim da arte que o inspira.
Não tenho certeza, mas acho que tem mais textos/comentários expalhados por aí do que propriamente aqui...são parcerias lembra? rsrsr !!!!!!!

beijos,

MARTHA THORMAN VON MADERS disse...

Nossa! Que texto maravilhoso, escrito com maestria.
parabéns.
beijos.
Vá por lá tenho novidades.

Lomyne disse...

Seja o banco da novena ou o lugar no sofá, ou a posição da mesa de trabalho, o fato é que as pessoas gostam da mesmice, da rotina...

Selena Sartorelo disse...

Olá Martha,

Obrigada estou tentando..sempre..beijos e vou correndo lá ver tuas novidades que mesmo sem vê-las, sei que vem coisa muito boa por aí.

Olá Lomyne,

Pois é, estou meio cansada de grandes fatos e histórias estonteantes, surpresas e acontecimentos avassaladores, escandalos e tantos absurdos que infelizmente são reais...um salve a mesmice, ao sem graça ou quem sabe ao simples e comum, mesmo que só sejam encontrados em estórias e ficção e que hoje tão pouco é valorizado e esquecemos como isso nos faz bem as vezes também.

Penso ter entendido essa mesmice a que se refere, uma acomodação, um conforto e o medo de arriscar...dependendo do momento aceito ou não.

Obrigada por sua visita e seja sempre muito bem vinda exatamente como pensa rsrsr gosto disso também.

beijos,

Maria Augusta disse...

Selena, vim aqui conhecer teu cantinho e estou adorando. Logo na chegada já vi o céu estrelado e a nebulosa, e me senti atraida como por um imã. Apreciei muito este conto, ia te acompanhando percorrendo a praça sob o sol quente e entrando na igreja...onde a calma foi interrompida pela chegada da mulher e seus hábitos arraigados. Muito bom!
Um abração e até logo.

Selena Sartorelo disse...

Ói que bom!!!
Adorei a tua visita...eu fico aqui tentando contar minhas estórias e histórias e adoro quando ouço, melhor sinto que sente também o que pretendo dizer..ói que bom!!!

beijos, e até bem logo rsrsr,

Anônimo disse...

Selena,
Não faz mal não conseguir inventar um nome pela imaginação tirada. Quem pinta é a minha filha. Uma senhorita já com 23 anos mas que desde pequenina que tem este dom :) Há mais Telas dela lá no Blog. Ela não leva a pintura a sério. Tudo o que faz é porque eu peço e decoro a minha casa com as estas Telas :) Já vendeu também, porque pediram, e tem vergonha de dizer que não porque a conhecem pessoalmente :) grande sorte ehehe
Está a terminar Arquitectura este ano, se deus quiser... espero!!!
Talvez depois do curso, se dedique mais por ter tempo mais livre... a ver vamos rsssss

Bjinho e obrigada pelas suas visitas. É sempre bem vinda.

Selena Sartorelo disse...

Querida...uma menina de 23 anos cria imagens tão fortes e densas assim..parabéns!!!!!Não entendo muito de arte mais do que elas possam me transmitir, mais do que com elas consigo entender e sentir...dei um nome sim é RASGO..mas quando escrevi pela segunda vez pensei em materia necrosada. Parabéns!!
Minha menina de 9 anos também adora desenhar desde pequena..e sempre dizia que queria ser pintora quando crescer..ai um dia ela veio com uma.- Sabe mamãe nao vou mas ser pintora..sabe... esses artista só ficam famosos depois que morrem..que chato isso não é?
Mas hoje com 9 anos ela ainda pinta e desenha e nem lembra mais do que falou ...diz pra sua menina que se um dia puder vou comprar essa tela dela e não vai ser como objeto de decoração...se estiver a venda claro.

beijos,

O_ENVIADO disse...

Deixo.te o meu sopro...

the dear Zé disse...

Estou sem palavras.
Nunca assim, uma pessoa desconhecida me ofereceu um poema (creio que é seu), assim sem mais nem menos, assim deste modo... desinteressado, assim como um tiro que acerta certeiro onde dá prazer...
Foi, está a ser, o melhor momento do meu dia, abrir o computador como uma ostra e encontar lá dentro uma pérola, de palavras que são as mais preciosas das pérolas.

Quanto à foto, se é a do perfil que se refere, é que caçador tem de ter ar feroz mesmo, para intimidar as presas e afastar os predadores. É uma vida dura.

E agora me vou mas deixo aqui um enorme beijo.

p.s. gostava de saber mais da história do elefante...

Selena Sartorelo disse...

Olá caçador..que bom que gostou..Sim é meu..na verdade é seu..o escrevi lá...onde ele nasceu..adoraria contar-lhe a outra história..um dia quem sabe a mesma inspiração apareça.
Estou com um largo sorriso o presente foi meu se permitir assim.

Agora entendo a foto..

beijos,

Selena Sartorelo disse...

Olá Enviado,

Obrigada pela visita e por um sopro tão sereno.

Beijos

Ricardo Soares disse...

éeéé... as possibilidades da internet são muitas... entre as quais encontrar um blog chamado Possibilidades onde a autora faz um comentário anarquista no blog do Marcinho Gaspar...daí eu chego aqui e gosto...e se gosto passo a frequentar ? bem vindo ? não sei... só sei que cheguei...bjs

Selena Sartorelo disse...

Olá Ricardo,

Chegue e fique a vontade...álias não fique só para concordar..fique aqui e fale o que desejar se acaso gostar ou não...Claro que é bem vindo afinal escrevemos ( no meu caso eu tento) para sermos lidos também né não? E quanto ao comentário anarquista ai meu Deus..deve estar falando do blog do Neil é isso? só pode...rsrsr
Ih vou lá prá ver se ele respondeu.
beijos.

Anônimo disse...

Selena,
Tem um PRÉMIO Simpatia no meu Blog 'os meus miminhos' para si...é selectivo :)

Também pode trazer o Presente de Páscoa (ovos)... estes não engordam :)

Feliz Páscoa.

Selena Sartorelo disse...

Olá Ellen,

Assim eu fico sem graça, mas pode deixar eu vou preparar um presente prô cê também..agora deixa eu correr porque eu adorooooooooo ganhar presentes..beijos e feliz páscoa.

Dona Sra. Urtigão disse...

OLÁ!
Tenho andado em tantos caminhos, -voce sabe, andou me visitando, agradeço.
Mas quase que parei neste modo de ser, pois minha máquina/equipamento indispensável para essas venturas (assim mesmo, sem o a ) está "tipo assim, só funciona quando quer".
Ai consigo entrar e encontro este conto, uma descrição tão cuidadosa e poética, que me sinto vendo o que voce narra.
Abraço.

Selena Sartorelo disse...

Olá minha querida amiga...acho qe posso lhe chamar assim.
Sim. Eu tenho acompanhado teus passos e sinto falta da tua tão querida presença...Começo a perceber hoje o quanto nossas máquinas são falhas e quanto aprendemos com isso não é mesmo? rsrs...Obrigada por me presentear com tua companhia nesses passeios que faço.

Beijos e Boa Páscoa e que a sabedoria que alcança seja estendida á todos nós.